Creio que o momento mais
significativo e mágico de minha vida aconteceu quando descobri que já conseguia
ler. Estava passeando de carro com minha mãe e de repente percebi que já
conseguia ler os nomes dos prédios pelos quais passávamos. As letras, as sílabas,
finalmente formavam palavras e tinham sentido. Um universo antes criptografado
para mim estava agora se abrindo. Foi uma sensação tão intensa que passados
quase meio século ainda consigo senti-la. Para mim este momento foi uma
epifania, um divisor de águas. São poucos os momentos
que realmente marcam nossas vidas, a descoberta do amor, o nascimento de um
filho e com certeza se descobrir como leitor. O importante é nunca esquecer o
quanto eles foram marcantes.
Fui alfabetizado muito criança, em
casa, por minha avó materna. Uma grande educadora e leitora que acabou sendo
para mim mais do que minha mestra foi um modelo a ser seguido e copiado. O
cantor Gilberto Gil numa entrevista recente também declarou que sua avó foi uma
professora paradigmática porque o ensinou a ler e a escrever. Vejo como
abençoados aqueles que propiciam aos outros a oportunidade de transpor os
portões de um mundo sem palavras.
Com o tempo me tornei um apaixonado
por livros, na infância adorava o encarte Recreio da Folha de São Paulo e também
do gibi da Mônica e do Cebolinha. Já na adolescência me apaixonei perdidamente
por Conan Doyle e seu detetive Sherlock Holmes e também por Agatha Christie com
seu detetive igualmente famoso Hercule Poirot, passava tardes inteiras lendo
esses autores embaixo da sombra do pé de jabuticaba que tomava conta de nosso
quintal. Se fechar bem os olhos ainda consigo sentir o cheiro das jabuticabas.
Chegando perto da maioridade encontrei Machado de Assis e foi amor à primeira
leitura. Hoje no limiar da maturidade não consigo imaginar uma vida sem que ela
seja entremeada por histórias.
Faço minhas as palavras de Marilena
Chauí quando disse que o livro é um mundo porque cria mundos ou porque deseja
subverter este nosso mundo. Ainda hoje prefiro viajar através dos livros em vez
de fazer turismo pelo mundo afora. Machado de Assis declarava quase a mesma
coisa quando dizia que não via necessidade de sair do Rio de Janeiro já que o
mundo todo estava ao alcance de sua mão. Antônio Candido segue por esse mesmo
caminho ao postular que as produções literárias, de todos os tipos e de todos
os níveis, satisfazem necessidades básicas do ser humano, sobretudo através
dessa incorporação que enriquece a nossa percepção e a nossa visão de mundo.
José Augusto Heeren
Excelente texto José Augusto.Gostei muito da sua explanação quanto as suas experiências de vida.
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